O DIREITO DE CIDADANIA AMERICANA SOB O NOVO GOVERNO TRUMP

Mark Morais
No artigo anterior, falamos sobre algumas acertadas medidas que o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, pretende adotar em relação à política de imigração. Votei em Trump todas as vezes que ele se candidatou, e me identifico com muitas das suas ações e opiniões; mas o bilionário, ao contrário de mim, não é perfeito e não consegue acertar sempre.
Por exemplo, Trump afirmou que pretende acabar com a cidadania por direito de nascença dos filhos, nascidos nos EUA, de imigrantes ilegais. Essa foi, inclusive, uma de suas promessas de campanha. Trump pretende cancelar esse direito já em seu primeiro dia de trabalho, determinando que, para o reconhecimento da cidadania automática das crianças estrangeiras nascidas nos EUA, seja necessário que ao menos um dos pais, seja residente permanente legal ou cidadão americano. Entretanto, essa não será uma luta fácil para Trump; afinal, a cidadania dos filhos de imigrantes ilegais nascidos nos Estados Unidos decorre diretamente da Constituição americana, que, em sua 14ª Emenda, afirma, em parte, que “todas as pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos e sujeitas à jurisdição dos mesmos são cidadãos dos Estados Unidos e do Estado onde residem”. Resumindo: Trump pretende extinguir um direito constitucional criado a mais de 150 anos!
Em meu primeiro livro, IMIGRANDO COM MARK MORAIS – As Histórias (Quase) Secretas do Único Advogado Brasileiro Americano Que Trabalhou Nas Três Maiores Agências de Imigração dos Estados Unidos, abordo de maneira detalhada a questão da cidadania, que é, resumidamente, a condição de uma pessoa perante um determinado país. Nos Estados Unidos, a cidadania pode ser originária ou adquirida. Vejamos:
Cidadania originária: Ocorre em razão do jus soli, o “direito do solo”, determinado pelo local de nascimento da pessoa; ou do jus sanguinis, o “direito de sangue”, determinado pelo seu parentesco. No primeiro caso, qualquer pessoa nascida em solo americano será considerada um cidadão natural do país, nada importando que seus pais sejam imigrantes ilegais; na segunda hipótese, a cidadania decorre da condição dos pais da criança: caso um dos pais, ou ambos, sejam americanos, os filhos nascidos fora do país também poderão ser considerados cidadãos americanos desde que observadas certas condições.
Cidadania adquirida: Decorre de um processo de naturalização de alguém que nasceu fora do território americano, que não se qualifica para cidadania pelo jus solis ou jus sanguinis, mas deseja se tornar cidadão americano. Para isso ele deverá cumprir uma série de requisitos, sucessivos e cumulativos, ou seja, será preciso atender a todos as exigências: Idade mínima de 18 anos, ser um residente permanente dos Estados Unidos, possuir residência contínua e presença física no país, demonstrar conhecimento da língua inglesa, demonstrar boa conduta e caráter, demonstrar conhecimentos da História americana e do governo, e demonstrar lealdade ao país.
A cidadania é tratada de maneira diferente entre os países e nem todas as nações entregam de bandeja a nacionalidade só porque uma pessoa nasceu em solo daquele país. Ou seja, nem todos os países adotam a forma livre do jus solis. Dos países do continente europeu, nenhum adota o jus solis de forma absoluta. Na verdade, todos os países da Europa, vão sempre colocar alguma outra condição (algummas mais restritivas que outras) para ser considerado cidadão daquele país, além do fato de ter nascido no território em questão. Então, o Birthright Citizensip (direito de cidadania ao nascer) é raro em nações desenvolvidas. Portanto, o que o Trump quer acabar, jus solis, não é nenhuma novidade em grande parte dos países mundo afora.
Eu sou contra a extinção do direito de cidadania para quem nasce nos EUA, independentemente da condição imigratória dos pais; é uma questão de lógica e de justiça. Falamos acima da 14ª Emenda: adotada em 1868, após a traumática Guerra Civil Americana, visava proteger especialmente os escravos recém-libertos; contudo, acabou ampliando os direitos de todos os indivíduos nos Estados Unidos. A 14ª Emenda declara que “todas as pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos e sujeitas à sua jurisdição, são cidadãos dos Estados Unidos e do Estado onde residem”. Concordo com esse direito; e o presidente não deveria mudar isso; menos ainda deveria tentar isso através de um decreto administrativo; isto seria uma grave afronta à Constituição do país, a primeira constituição escrita do mundo. Ao invés, seria melhor exercer um rígido controle sobre entrada de imigrantes ilegais nos EUA –o que, efetivamente, está nos planos do novo governo. Além disso, e principalmente, Trump deveria acabar com a farra dos pedidos de asilo fraudulentos; segundo o “Instituto Data Mark Morais de Pesquisas Suspeitas”, de cada 10 pedidos de asilo, 11 são fraudulentos; a maioria dos estrangeiros que solicitam asilo está, na verdade, de olho em receber uma autorização de trabalho. Atualmente, quem possui um pedido de asilo protocolado e pendente por 150 dias pode solicitar autorização de trabalho, e o governo acaba processando este pedido de autorização trabalho decorrente da solicitação de asilo em 30 dias. Por outro lado, pedidos de autorização de trabalho em casos legítimos e fundamentados, como em situações de pedidos de familiares de portadores de vistos, ou através de ofertas de emprego feitas por patrocinadores americanos, ficam em segundo plano e levam meses para serem analisados. E, como os pedidos de asilo demoram anos para ser julgados, o solicitante, que, geralmente, é apenas um imigrante ilegal, vai levando a vida tranquilamente nos EUA, trabalhando sem qualquer empecilho. Até o governo conseguir concluir que foi vítima de uma fraude, vários anos terão se passado e o fraudador estará impune.
Portanto, ao invés de violar a Constituição Americana em um tema tão sensível quanto o direito à cidadania pelo jus solis, o futuro presidente Donald Trump deveria utilizar outros meios legítimos e eficazes para limitar a entrada de imigrantes ilegais; ele pode utilizar ações executivas em matérias nas quais possui autonomia – fiscalização das fronteiras, por exemplo, sem nem mesmo precisar de autorização do Congresso.
Deixe a Constituição em paz, Senhor Presidente.
Sobre Mark Morais
Mark Morais é advogado de Imigração e proprietário da Mark Morais Law Firm, escritório americano responsável por processos jurídicos de vistos e green cards para os Estados Unidos.
Mark é o único advogado brasileiro-americano que já trabalhou nas 3 principais agências federais de imigração dos EUA (USCIS, CBP e ICE) desempenhando as funções de Promotor de Imigração, Oficial de Asilo Político e Policial Federal de Imigração e Alfândega.
Mark Morais é formado em Direito e Administração de Empresas no Brasil e é Doutor em Jurisprudência nos Estados Unidos. Ele é licenciado para praticar Direito no Estado da Flórida e também na Capital Federal (District of Columbia).
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