DESATANDO NÓS – Imigração para os EUA

Mark Morais
A canção do personagem Maui na divertida animação Moana reflete o espanto que os reles mortais deveriam sentir diante do poderoso semideus, interpretado por Dwayne “The Rock” Johnson. Pois deve ter sido exatamente assim que o pessoal do USCIS deve ter se sentido ao se deparar com o caso que vamos relatar aqui, e que a Mark Morais Law Firm só conseguiu reverter com muito conhecimento e experiência, consertando um erro do USCIS e garantindo o Green Card para -mais uma!- cliente.
Antes de prosseguir, um alerta: muitas pessoas sonham em imigrar legalmente para os Estados Unidos, mas acham que o processo imigratório é “fácil” e, por isso, procuram por “consultorias” baratas. Afinal, pensam, basta apenas “juntar a documentação e preencher uns formulários” e a mágica acontece, não havendo necessidade de investir em advogados que “se acham” só porque fizeram faculdade de Direito nos EUA e passaram no facílimo exame da Ordem. E existem muitos “profissionais” no mercado que alimentam essa falácia para cobrar valores irrisórios por sua atuação; no entanto, esses “profissionais” acabam perdendo os processos e deixando seus clientes a ver navios, sem o sonhado Green Card e muitos dólares mais pobres. É o famoso “barato que sai caro”.
Se a nossa cliente, Madame X, pensasse dessa forma e não nos contratasse, fatalmente estaria impedida de lutar pelo sonho americano. Leia o caso abaixo e decida se uma “consultoria” seria capaz de desatar os diversos nós que surgiram no decorrer do processo, solucionando todas as complexas questões com que nos deparamos até a solução final da demanda; inclusive, por diversas vezes, foi necessário “educar” os oficiais do USCIS sobre como as leis imigratórias funcionam (You’re welcome, USCIS). Sim, você leu direito: Advogados de imigração com bastante experiência costumam saber muito mais das leis do que a maioria dos oficiais e juízes que atuam na área.
Aos fatos, pois:
- Madame X e Mister Y (nomes fictícios), apaixonados, resolveram se casar. Madame X se encontrava em solo americano em posse de um visto J-1 (estudantes de pós-graduação, estrangeiros graduados em medicina buscando especialização, alguns profissionais em programas de trainee, acadêmicos patrocinados por universidades como docentes temporários) cuja expiração estava próxima; por sua vez, Mister Y possuía o Green Card (GC), ainda não era cidadão americano na época. Ou seja, a categoria de preferência era um F2-A, visto de família através de casamento com portador de GC;
- Mister Y havia recebido o GC como derivado do processo de EB-5 dos seus pais, visto destinado a investidores; quer dizer, o seu Green Card ainda era apenas condicional (Mas, espere um pouco: ao se casar, Mister Y não deixa de ser dependente do processo de EB5 dos pais?);
- Mister Y e Madame X se casam. Nesse momento, demos entrada no I-130, combinado com I-485 (ajuste de status) enquanto o status J-1 de Madame X ainda estava válido (Mas, espere mais um pouco: é possível dar entrada em pedido de ajuste de status para casamento com um portador de GC? Como fica a questão do boletim de vistos das tabelas de final action Vs. tabela de dates for filing? O USCIS pode decidir qual tabela vai usar para aceitar I-485?);
- A petição de casamento I-130 foi aprovada, pois a legitimidade do casamento foi comprovada; porém o I-485 foi negado sem RFE (Solicitação de Informações Adicionais por parte do USCIS) sob a alegação de que, quando Madame X protocolou o pedido de ajuste, não havia vistos disponíveis;
- Imediatamente, entramos com uma Motion to Reopen and Reconsider (MTR) em razão da má aplicação da lei nesse caso: Sobre a alegação do USCIS de que não havia vistos disponíveis no momento da aplicação do I-485, nós discorremos que, embora a decisão negativa do I-485 tenha mencionado que a Disponibilidade de Vistos é regida pelo Boletim de Vistos mensal publicado pelo Departamento de Estado dos EUA, o oficial do USCIS “não percebeu” que o Boletim de Vistos contém duas tabelas diferentes, e que o USCIS também determina, mensalmente, qual tabela deve ser observada para solicitação de ajuste de status. Demonstramos, ainda, que, no momento da solicitação de ajuste de status feita por Madame X, o USCIS empregou a tabela de Final Action, ao invés da tabela Dates for Filing, para as categorias de preferência F2A a fim de determinar a elegibilidade para ajuste de status. Ademais, a seção INA 245(a)(3) exige apenas que um visto esteja imediatamente disponível para o Requerente no momento em que o seu pedido de ajustamento é apresentado, e não no momento em que a aplicação será julgada. Concluímos a MTR argumentando que um visto estava disponível no momento em que Madame X apresentou o formulário I-485. Além disso, lembramos o USCIS de que o Oficial, na sua decisão negativa, determinou que Madame X havia sido inspecionada e admitida nos Estados Unidos. Além disso, Madame X era elegível e admissível nos Estados Unidos quando protocolou o formulário I-485, satisfazendo, portanto, todos os requisitos e estabelecendo sua elegibilidade para ajuste de status ao abrigo do INA 245(a). Por estas razões, comprovamos que a decisão do USCIS de negar o pedido de ajustamento de status de Madame X foi um erro grave e deveria ser revertida. Por conseguinte, o caso deveria ser reaberto e a decisão, reconsiderada, com a concessão de seu pedido de ajuste de status como único resultado aceitável;
A Mark Morais Law Firm corrigiu um erro do USCIS e garantiu visto para cliente. Créditos: Shutterstock, Inc.
- O benefício de ajuste de status é discricionário do USCIS e, portanto, não passível de apelação; entretanto, cabe pedido de reconsideração, o qual será direcionado para o escritório do USCIS que emitiu a decisão inicial. Ou seja, você precisa convencer a mesma pessoa que emitiu a decisão de que ela estava errada. Qualquer marido que já tentou persuadir sua esposa de que ela cometeu um erro sabe como isso é praticamente impossível; pois bem, nós conseguimos! (Não que o USCIS seja nossa esposa, mas) como toda boa esposa, o USCIS concordou que estava errado, mas de uma forma bem velada: obviamente, não foi emitida uma decisão na MTR dizendo textualmente: “Ok, você está certo e nós estamos errados”; contudo, o caso foi reaberto na surdina através da emissão de uma RFE no I-485. Ou seja, como toda esposa que se preze, o USCIS até admitiu seu desacerto, pero no mucho: a briga ainda iria continuar em grau de RFE.
- Na RFE, um dos pontos questionados foi que Madame X teria deixado de manter um status imigratório válido durante todo o processo; em nossa resposta lembramos ao USCIS que, assim como nos casos de estudantes com F-1, quem entra nos EUA com um visto J-1 é admitido com duration of status e, portanto, não está vinculado a uma data fixa definida; também ensinamos ao oficial julgador que, de acordo com as seções INA 245(c)(2) e INA 245(c)(8), além do USCIS Policy Manual, Volume 7, Parte B, Capítulo 4, que trata, entre outras coisas, dos impedimentos ao ajuste de status, para fins de restrições ao ajuste, um estrangeiro apenas precisa manter seu status de não-imigrante válido até o momento em que protocolar adequadamente um pedido de ajuste de status junto ao USCIS, mesmo que fique sem status válido após o protocolo, bastando somente que não se envolva em trabalho não autorizado;
- Outro ponto bastante crítico na RFE foi o fato de nossos apaixonados pombinhos, Madame X e Mister Y, terem decidido viajar em lua-de-mel para as Bahamas durante quatro dias enquanto o processo estava nesse terrível imbróglio com o USCIS, sem, é claro, consultarem antes o advogado do caso, ou seja, este que vos escreve. Quanto a isso, a RFE apontou: “Nossos registros mostram que você saiu dos Estados Unidos em XX de XXX de 2023 e, em XX de XXX de 2023, voltou a entrar vindo de um país estrangeiro. Envie provas de que você recebeu advance parole antes de sua partida dos EUA. Você também deverá provar que o advance parole estava válido para os Estados Unidos ao retornar desta viagem. Os registros não refletem que você apresentou um documento de advance parole ao oficial de imigração em um porto de entrada (porto marítimo). Se você não saiu dos Estados Unidos, forneça provas de que não saiu dos Estados Unidos”. Ou seja, o sistema de dados do governo mostrava que houvera uma saída dos EUA, mas não havia registros da volta ao país. Uma viagem de quatro dias às Bahamas poderia jogar por terra todo o processo. Valeu a pena?! Bem, neste caso, sim, pois Madame X tinha ao seu favor ninguém menos que a Mark Morais Law Firm para vir em seu socorro. Mas, e se ela tivesse contratado uma assessoria sem licença para praticar advocacia nos EUA? Possivelmente, estaria em péssimos lençóis. A maiorias das pessoas que está com uma aplicação de ajuste de status pendente só pode sair dos EUA se obtiver uma autorização de viagem (advance parole) antes de sair do país; caso contrário o I-485 será considerado abandonado e a pessoa pode ficar com status ilegal nos EUA. Ou seja, o USCIS solicitou provas adicionais de que Madame X tivesse recebido essa autorização de viagem antes de sua partida, bem como prova de que possuía o advance parole ao retornar da sua romântica viagem;
- Inicialmente, apresentamos documentação demonstrando que ela obteve advance parole antecipada e que essa autorização fora obtida bem antes de sua viagem de cruzeiro às Bahamas e, portanto, o pré-requisito fora cumprido antes de deixar os Estados Unidos; em segundo lugar, quanto a Madame X possuir advance parole após seu retorno da viagem, nós destacamos que, quando o apaixonado casal retornou da viagem, o Oficial do CBP no porto de entrada (Porto Marítimo de Miami) mencionou que não carimbaria o passaporte de Madame X pois sua viagem às Bahamas não foi considerada uma saída significativa (Meaningful Departure) e durou menos de 30 dias. Além disso, mostramos que a viagem era do tipo “cruzeiro circuito-fechado” (closed-loop) para as Bahamas. Um cruzeiro circuito-fechado é uma viagem que se origina e termina no mesmo porto dos EUA, sendo a única escala no exterior o país de destino; neste caso, as Bahamas. De acordo com os regulamentos de imigração relevantes, especificamente o Guia de Inspeção de Navios da Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA, os viajantes que partem em cruzeiros circuito-fechado não estão sujeitos aos procedimentos tradicionais na reentrada nos Estados Unidos, que podem incluir a emissão de um carimbo de entrada na I-94. Isso ocorre porque esses cruzeiros são tratados de forma diferente devido às limitadas viagens ao exterior envolvidas e ao fato da partida e do retorno do viajante se darem no mesmo porto dos EUA. Por exemplo, e de acordo com o mesmo Guia, um Formulário CBP I-94 não é exigido se o passageiro for um não-imigrante na posse de um I-94 do CBP emitido nos 30 dias anteriores da chegada do território contíguo. Além disso, um viajante pode estar isento da exigência de obter um I-94 ao reentrar nos Estados Unidos após uma breve visita a determinados territórios contíguos ou ilhas adjacentes, o que inclui cruzeiros para as Bahamas. Nesses casos, o oficial do CBP pode optar por não emitir carimbo de entrada quando a viagem for para uma ilha adjacente, como, vejam vocês, as… Bahamas. Esse era exatamente o caso da nossa cliente Madame X, que partiu do Porto de Miami com destino às Bahamas e retornou ao mesmo Porto, quatro dias depois. A viagem de Madame X deu-se para uma ilha adjacente e em um cruzeiro circuito-fechado, ou seja, ambas as situações reforçam o fato de que sua viagem não exigia um novo formulário I-94 em seu retorno aos EUA. Situações desse tipo também podem ocorrer, por exemplo, quando há a chamada revalidação automática de visto em um porto de entrada inspecionado pela Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA. Como tal, uma revalidação automática pode ocorrer quando:
- Não-imigrantes que partiram dos Estados Unidos para viagens breves ao Canadá, ao México ou a uma ilha adjacente (para não-imigrantes F e J) por 30 dias ou menos.
- Não-imigrantes com carimbo de admissão válido (não vencido) ou formulário em papel I-94, Registro de Chegada/Partida, endossado pelo Departamento de Segurança Interna (DHS)”.
- A situação de Madame X era semelhante aos cenários em que o CBP aplica revalidações automáticas de vistos a viajantes quando, mesmo que tenham sido inspecionados e admitidos ou parolados por um oficial de imigração, o CBP não carimbará seus passaportes, nem fará uma nova entrada no sistema eletrônico I-94. Além disso, uma viagem às Bahamas, ou seja, uma ilha adjacente, não é considerada uma partida significativa (Meaningful Departure) dos Estados Unidos. Consequentemente, Madame X não recebeu um carimbo de parole nem uma entrada no sistema I-94 sob as diretrizes do CBP, embora tenha deixado o país com um documento válido e não vencido de advance parole, apresentado seu passaporte e a autorização de viagem a um oficial do CBP após seu retorno aos Estados Unidos, e foi legalmente inspecionada e parolada de volta ao país. Como se vê, uma viagem para territórios contíguos ou ilhas adjacentes com duração inferior a 30 dias pode não contar como uma partida substancial dos Estados Unidos e pode não resultar na emissão de um novo registro de entrada/partida I-94 no sistema do CBP. A Orientação da Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA observa que viajar para o Canadá, México ou Caribe por menos de 30 dias (incluindo Bahamas) sem um novo pedido de visto, geralmente não exige que um viajante que sai dos Estados Unidos abra mão de um I-94, portanto, não resulta na emissão de um novo I-94 após seu retorno;
- Nós também invocamos a jurisprudência do caso Matter of Arrabally-Yerrabelly, o qual diz, basicamente, que uma saída e retorno com um advance parole não é necessariamente uma saída dos EUA;
- No meio do processo, Mister Y, que era portador de um GC, virou cidadão americano e, assim, conseguimos fazer o upgrade de Madame X, saindo da situação de parente de um cônjuge com Green Card para uma parente imediato de um cidadão americano;
- No final, o caso foi aprovado e Madame X recebeu o seu desejado Green Card.
Se é verdade que há males que vêm para bem, nesse caso, a demora em analisar e aprovar o pedido de Madame X proporcionou que, ao invés de receber o Green Card condicional, ela recebesse o documento definitivo, pois, no momento da aprovação do ajuste de status, Madame X já estava casada com Mister Y a mais de dois anos.
A moral dessa longa e tortuosa história? Simples: Trabalhar com imigração vai muito além de simplesmente preencher formulários! Somente quem conhece a fundo os conceitos primordiais do Direito Imigratório e a correlação das regras com suas exceções seria capaz de reverter uma negativa como essa. Na Mark Morais Law Firm todos os nossos clientes são tratados com a responsabilidade e competência que merecem, para que possam alcançar um único resultado: concretizar o sonho americano.
Sobre Mark Morais
Mark Morais é advogado de Imigração e proprietário da Mark Morais Law Firm, escritório americano responsável por processos jurídicos de vistos e green cards para os Estados Unidos.
Mark é o único advogado brasileiro-americano que já trabalhou nas 3 principais agências federais de imigração dos EUA (USCIS, CBP e ICE) desempenhando as funções de Promotor de Imigração, Oficial de Asilo Político e Policial Federal de Imigração e Alfândega.
Mark Morais é formado em Direito e Administração de Empresas no Brasil e é Doutor em Jurisprudência nos Estados Unidos. Ele é licenciado para praticar Direito no Estado da Flórida e também na Capital Federal (District of Columbia).
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