Mitos de Imigração – Dinheiro tem Limites

Mark Morais
EXISTEM ALGUNS MITOS RELACIONADOS À IMIGRAÇÃO. Um deles diz respeito à quantidade de dinheiro que se pode levar para os Estados Unidos. Por alguma razão, os brasileiros criaram a “lenda dos dez mil dólares”: esta seria a quantia máxima de dinheiro com que se pode entrar no país. Seria realmente curioso que os Estados Unidos, berço do capitalismo selvagem, estabelecessem um limite de entrada de dinheiro no país. Nada mais equivocado: desde que não seja dinheiro sujo (oriundo de atividades ilegais como tráfico de drogas), dinheiro é sempre muito bem-vindo à América, e o sorridente Tio Sam recebe de braços abertos todos os visitantes que chegam com suas carteiras recheadas. Quanto mais recheadas, maior é o sorriso.
Você pode entrar nos EUA trazendo quanto dinheiro quiser (ATENÇÃO: estamos falando das leis dos Estados Unidos; quanto a outros países, consulte a legislação local antes de viajar); basta informar o valor quando ele atinge ou ultrapassa os dez mil dólares, mediante preenchimento do Formulário de Transporte Internacional de Moeda ou Instrumentos Monetários, durante o voo, ou eletronicamente, nos aeroportos equipados com terminais automáticos; de qualquer maneira, mesmo que não tenha recebido um formulário, sempre será obrigação do viajante declarar para um oficial da Alfândega os valores transportados.
O limite é o mesmo, tanto para pessoas quanto para famílias. Declarar o real valor transportado jamais implica na retenção do valor que exceda dez mil dólares, ou no pagamento de qualquer imposto ou taxa; pelo contrário, o único risco de perda de valores é, justamente, quando o valor real, acima de dez mil, não for devidamente declarado. A lenda dos dez mil dólares leva os viajantes nacionais a lançarem mão do jeitinho brasileiro na tentativa equivocada, perigosa e quase sempre frustrada de burlar o limite inexistente; algumas situações são bastante comuns:
Distribuir o valor transportado pelos membros da família: muitos acham que, como o formulário pergunta quanto dinheiro você está trazendo, podem distribuir o valor entre os membros da família, de maneira que cada um deles esteja portando menos que dez mil dólares. Caso a “esperteza” seja descoberta, o “esperto” será multado, no mínimo; ou poderá ter o dinheiro todo confiscado e ainda responder criminalmente. Portanto, nada de declarar que a sua babá leva cinco mil dólares para visitar o Mickey Mouse, nem esconder outros cinco mil nas fraldas do neném.
Trazer a quantidade de dólares no limite, e o restante do dinheiro em reais: muitos trazem, além dos dólares permitidos sem necessidade de declaração, valores em outras moedas. A contagem é feita sobre o valor total, independentemente da moeda, equivalente ao montante em dólares; outra situação sujeita a multa, confisco e processo criminal.
Quando eu trabalhava como oficial do Customs and Border Protection (CBP), lidei com um caso assim: um casal de empresários do sul do Brasil viajava para visitar os filhos que estudavam no exterior: um nos EUA, outro na Europa. Os pais aproveitariam a visita para levar algum dinheiro aos pimpolhos; viajavam portando 40 mil dólares e 40 mil euros. Em espécie. Não declarados e escondidos. O oficial da Alfândega desconfiou deles e o CBP interrogou os dois em separado. As histórias não bateram, mas ambos, provavelmente em razão da lenda dos dez mil, sustentaram a mentira, de que não portavam valores acima do limite, mesmo após a oportunidade de corrigir a declaração. O CBP partiu para a revista corporal e da bagagem dos dois, obviamente encontrando –e confiscando- o dinheiro escondido. Agora, o casal corria o sério risco de ser preso; e, como eu era um dos únicos oficiais do CBP que falava português no Aeroporto Internacional de Miami, fui convocado para traduzir e dar minha opinião sobre o caso. Logo concluí que o dinheiro era de origem lícita, destinado ao sustento dos filhos distantes; o único problema deles era a crença na malfadada lenda, e por conta disto criaram aquela narrativa mentirosa e, por medo, se aferraram a ela. Tentei convencê-los a confessar a verdade, não para recuperar o dinheiro, mas tão somente para não serem presos; também me esforcei um bocado para convencer os detetives do ICE a não levarem em cana os dois turistas mal-informados e apavorados. Sucesso: foram-se os anéis (no nada singelo valor de 40 mil dólares e 40 mil euros) mas ficaram os dedos. O casal não foi preso, não seria criminalmente processado e poderia voltar aos Estados Unidos sempre que quisesse, porém, nas próximas vezes, independentemente do valor que transportasse, seria obrigatoriamente inspecionado na Alfândega.
Outra pergunta que muitos brasileiros me fazem é de quanto dinheiro em espécie devem levar para o oficial de imigração no aeroporto deixar entrar nos EUA. Ora, da mesma maneira que não existe um limite máximo para entrar com dinheiro nos EUA, também não existe um limite mínimo. Na verdade, dinheiro em espécie está tão démodê com o advento do cartão de crédito, pix, zelle, cashapp, e tantos outros, que é muito comum até para os viajantes internacionais mais endinheirados não trazerem um tostão furado em suas carteiras.
Portanto, saiba que você pode viajar para os Estados Unidos com quanto dinheiro quiser, ou sem dinheiro algum; apenas não seja:
a) ingênuo de acreditar em lendas urbanas sem fundamento; e
b) ingênuo de se achar mais esperto que os oficiais da Alfândega.
Isto pode te custar muito caro. Em dólares. Ou até o xilindró.
Sobre Mark Morais
Mark Morais é advogado de Imigração e proprietário da Mark Morais Law Firm, escritório americano responsável por processos jurídicos de vistos e green cards para os Estados Unidos.
Mark é o único advogado brasileiro-americano que já trabalhou nas 3 principais agências federais de imigração dos EUA (USCIS, CBP e ICE) desempenhando as funções de Promotor de Imigração, Oficial de Asilo Político e Policial Federal de Imigração e Alfândega.
Mark Morais é formado em Direito e Administração de Empresas no Brasil e é Doutor em Jurisprudência nos Estados Unidos. Ele é licenciado para praticar Direito no Estado da Flórida e também na Capital Federal (District of Columbia).