“Dando um Jeitinho”?

Mark Morais
O brasileiro é conhecido mundialmente pela sua criatividade e capacidade de adaptação. Esse traço da nossa personalidade recebeu o carinhoso título de “jeitinho brasileiro”, e descreve nossa facilidade em contornar as maiores dificuldades dispondo dos menores recursos; todo brasileiro é um MacGyver (agente secreto, personagem de seriado americano popular nos anos 1980, que era capaz de construir uma bomba usando um extintor de incêndio, fita adesiva, um clipe de papel e um chiclete mascado) em potencial. O ato de usar o que se tem à mão para criar uma ferramenta para solucionar um problema se chama gambiarra; e nós elevamos esta habilidade ao estado de arte. O problema é que, muitas vezes, o brasileiro usa seus “poderes” para o mal. Um belo exemplo do nosso “jeitinho” utilizado de maneira indevida é a quantidade de brasileiros tentando entrar nos Estados Unidos solicitando asilo político: em 2022, foram autuados 26.128 pedidos de asilo, mais que o dobro em relação ao ano anterior, fazendo do Brasil o nono país, em números absolutos, com mais pedidos de asilo junto à imigração dos EUA. A esmagadora maioria destes pedidos está relacionada às dificuldades econômicas que o país atravessa e às discordâncias políticas em relação ao governo.
O asilo político é concedido pelos EUA às pessoas que se declaram perseguidas ou ameaçadas em seu país de origem, por questões de raça, religião, posição política, nacionalidade, etnia ou por fazer parte de um grupo social especificado pela lei; esta definição envolve inúmeras situações, e pode englobar pessoas ameaçadas por sua orientação sexual, mulheres vítimas de violência doméstica ou jovens que participavam de gangues criminosas e agora são perseguidos e ameaçados por elas, por exemplo.
Para receber o status de asilado político, além de se encontrar em situação de risco, é preciso comprovar que o governo de seu país não é capaz ou não demonstra interesse em protegê-la, ou, pior, é o próprio responsável por aquele perigo iminente; além disso, é preciso comprovar que o deslocamento dentro do próprio país não seria suficiente para eliminar aquele risco. No imenso Brasil, por exemplo, é bastante difícil conseguir demonstrar tal situação.
A Justiça dos EUA acumula 1,6 milhão de casos de asilo pendentes de julgamento. Parte desses pedidos é de imigrantes ilegais que pedem asilo para escaparem de uma deportação praticamente certa. E uma grande parte é de brasileiros tentando “dar um jeitinho” de burlar a lei para entrar ilegalmente no país.
Outro exemplo do malfadado “jeitinho brasileiro” (mas neste truque os patriotas não estão sozinhos; pessoas de outras nacionalidades também aderiram ao golpe) é a utilização de “famílias falsas” para tentar entrar ilegalmente nos EUA, uma vez que é mais fácil para o imigrante atravessar a fronteira se estiver acompanhado da família pois, de acordo com a lei americana, menores de 18 anos só podem permanecer nos centros de detenção por até 21 dias, devendo ser obrigatoriamente soltos após isso, aguardando a conclusão do caso em liberdade, podendo, obviamente, desaparecer assim que colocam os pés na rua. Quando esta notícia vazou, quase um milhão de pessoas acorreu imediatamente para as fronteiras. Os contrabandistas intermediavam o negócio entre os pais biológicos e o pais falsos, de maneira a distribuírem os filhos entre eles para que todos pudessem tentar atravessar para os EUA; o valor pago pelos pais falsos, que pode chegar a cinco mil de dólares, para “alugar” os filhos, cobria toda a despesa dos pais verdadeiros para também entrar no país. Crianças bem pequenas e bebês de colo são mais desejáveis, pois não são capazes de responder às perguntas dos patrulheiros das fronteiras e, assim, não podem desmascarar a farsa. Uma vez em território americano, os filhos seriam devolvidos aos pais; ao menos esse era o combinado; mas como contar com a honestidade de quem já está fazendo parte de uma farsa? Por conta desta prática deplorável, durante a crise de 2018-2019 era possível encontrar várias crianças pequenas abandonadas, vagando sozinhas e perdidas nos campos do Texas.
A partir de 2019, o ICE passou a aplicar testes rápidos de DNA na fronteira do sul, reduzindo imediatamente a possibilidade de sucesso dos espertalhões; porém, na gestão do democrata e ultraliberal Joe Biden, a utilização dos testes foi drasticamente reduzida a poucas dezenas por mês, a ponto de reportagem do Wall Street Journal de 08 de maio de 2022 indicar que milhares de adultos brasileiros entraram nos EUA acompanhados de “crianças falsas”.
Ou seja, mais uma vez, o “jeitinho brasileiro” utilizado de maneira desonesta envergonha o país aos olhos do mundo.
Sobre Mark Morais
Mark Morais é advogado de Imigração e proprietário da Mark Morais Law Firm, escritório americano responsável por processos jurídicos de vistos e green cards para os Estados Unidos.
Mark é o único advogado brasileiro-americano que já trabalhou nas 3 principais agências federais de imigração dos EUA (USCIS, CBP e ICE) desempenhando as funções de Promotor de Imigração, Oficial de Asilo Político e Policial Federal de Imigração e Alfândega.
Mark Morais é formado em Direito e Administração de Empresas no Brasil e é Doutor em Jurisprudência nos Estados Unidos. Ele é licenciado para praticar Direito no Estado da Flórida e também na Capital Federal (District of Columbia).