Apertando o cerco

Mark Morais
ULTIMAMENTE ANDO CONCORDANDO com algumas atitudes do presidente Joe Biden; acho que ele finalmente criou algum juízo. Antes tarde do que nunca…
O governo dos EUA anunciou uma série de medidas para restringir a chegada de imigrantes ao país. As novas diretrizes devem entrar em vigor a partir de maio e terão a duração de dois anos. Segundo estas regras, os estrangeiros que almejarem obter asilo serão obrigados a solicitar o benefício em portos de entradas devidamente autorizados. Quem entrar “sorrateiramente”, ou seja, por locais diversos destes portos autorizados, será considerado inelegível ao benefício de asilo.
Outro ponto importante da nova regra proposta, torna inelegíveis ao benefício do asilo aqueles que, antes de chegar aos EUA, cruzaram outros países e não requisitaram asilo político nestes países. A regra faz todo sentido, pois, se alguém diz estar fugindo de perseguição em seu país de origem, onde tortura, ou até mesmo a morte, seriam iminentes a lógica levaria esta pessoa a pedir refúgio no primeiro lugar que pudesse afastar o risco de perseguição, e não ficar escolhendo o melhor país para poder morar. Inclusive, esse era um dos argumentos que eu utilizava em meus tempos de promotoria do ICE para justificar que o imigrante não deveria ser agraciado com o benefício do asilo.
Enfim: Como era de se esperar, entidades de direitos humanos criticaram as medidas, comparando-as com a tentativa do malvadão republicano Donald Trump de barrar as caravanas que chegavam da América Central em 2019. Naquela época, a justiça americana barrou a tentativa; a ver como vai se comportar agora…
A nova regra, que substituirá o Título 42 (norma sanitária criada por Trump para combater a pandemia de Covid-19), visa dificultar a concessão de asilo para os imigrantes que burlam os processos legais para a obtenção do benefício. Desde janeiro o CBP (Customs and Border Protection) lançou um aplicativo pelo qual o candidato ao asilo deve preencher um formulário digital, ainda em seu país de origem, antes de viajar para os EUA. Caso o pedido seja negado ou o imigrante tente entrar ilegalmente no país, a pessoa será devolvida ao México e será impedida de participar do programa novamente, além de ser proibida de entrar nos EUA por cinco anos. Segundo o presidente Joe Biden, a aplicação da regra será rigorosa.
“O aplicativo foi projetado para desencorajar indivíduos de se aglomerarem perto da fronteira e criar condições inseguras”, disse o secretário de Segurança Interna dos EUA, Alejandro Mayorkas. “Depois que o pedido do Título 42 for suspenso, esse mecanismo de agendamento estará disponível para estrangeiros, incluindo aqueles que buscam solicitar asilo, para agendar um horário para se apresentar em um porto de entrada para inspeção e processamento, em vez de chegar sem avisar em um porto de entrada ou tentando cruzar fora dos portos de entrada”, completou Mayorkas. “Aqueles que usam esse processo geralmente serão elegíveis para autorização de trabalho enquanto estiverem nos Estados Unidos.”
Algumas exceções a esta regra estão previstas, como falhas técnicas, barreiras linguísticas ou analfabetismo que impeça o candidato de utilizar o aplicativo, além de “emergências médicas agudas” ou “ameaças extremas e iminentes à vida ou à segurança” do imigrante. Crianças desacompanhadas também serão tratadas com mais flexibilidade. O presidente americano defendeu que esta seria a única forma de conter o massivo aumento de imigração no país; a oposição republicana acusa a administração Biden de ter perdido o controle das fronteiras. Em dezembro de 2022, os EUA estavam recebendo na fronteira em média, pasmem, 8.500 imigrantes por dia!
As novas regras já estão valendo para imigrantes oriundos da Ucrânia, Nicarágua, Cuba, Venezuela e Haiti. Após o início da aplicação das medidas em 5 de janeiro, houve uma redução de incríveis 97% de imigrantes originários destes países, caindo de 1.200 para apenas 35.
As novas regras receberam duras críticas de grupos de direitos humanos, como a Anistia Internacional, a União Americana Pelas Liberdades Civis e a Oxfam America, entre outras. Abby Maxman, presidente da Oxfam, afirmou que a nova política “é ilegal, imoral e terá um custo humano terrível para crianças, mulheres e homens que buscam segurança”. Ser comparado a Trump deve ter sido um duro golpe para o bonachão Joe Biden…
No ano passado, a tensão entre democratas, favoráveis ao afrouxamento das regras de imigração, e republicanos, defensores de uma política mais rigorosa nas fronteiras, chegou ao seu auge quando governadores de estados republicanos como Ron DeSantis, da Flórida, e Greg Abbott, do Texas, enviaram ônibus e aviões cheios de imigrantes para localidades democratas como Nova York e Washington. O sistema de abrigos municipal de Nova York recebeu cerca de 11 mil novos imigrantes em poucos meses, levando ao colapso do sistema, e a ilha de Martha’s Vineyard, refúgio dos milionários dos EUA (o ex-presidente Obama é proprietário de uma casa no local), recebeu inesperadamente um avião cheio de imigrantes venezuelanos. O Texas enviou 6.200 imigrantes para a capital americana este ano, e dois ônibus lotados despejaram seus passageiros praticamente na porta da casa da vice-presidente Kamala Harris. Políticos de ambos os lados trocam farpas e acusações, e, no meio desta confusão, os contribuintes americanos pagam a conta. O estado da Flórida reservou 12 milhões de dólares para o programa de transporte de imigrantes indocumentados e refugiados para as cidades-santuário onde eles são bem recebidos; os estados de Illinois, Massachusetts e Nova York enfrentam gastos inesperados para fornecer abrigos e cuidados com a chegada repentina de tantas pessoas. Uma lei nova-iorquina editada há 35 anos determina que toda pessoa que busca abrigo na cidade tem direito a uma cama, mas, em vista do colapso do sistema, o prefeito da cidade afirmou que, diante da “realidade nova e imprevista” que ninguém “jamais poderia ter contemplado”, o procedimento deve ser reavaliado.
Acredito que os Estados Unidos sejam um dos melhores lugares do mundo, senão o melhor, para se viver. Acredito também que seja um país acolhedor, repleto de oportunidades para estrangeiros que sonham com uma vida melhor. Ora bolas! Sou advogado de imigração, ou seja, ganho o pão de cada dia ajudando estrangeiros a entrar nos Estados Unidos. A Lei é minha ferramenta, o Direito meu campo de batalha e a Justiça, meu ideal. Quando defendo um caso perante as autoridades da Imigração, estou lutando pelo que acho certo, legal e justo.
Mas defendo firmemente que o jogo seja jogado de acordo com as regras. Ao contrário dos flamenguistas e cruzeirenses, não acho que “roubado é mais gostoso”, e quando fui promotor do ICE presenciei a forma como os democratas costumavam ignorar as leis para facilitar a entrada de imigrantes ilegais que não se enquadravam nas hipóteses de asilo. A entrada indiscriminada de estrangeiros gera imensos problemas ao país, na medida em que inunda o mercado de trabalho com mão de obra barata, além de sobrecarregar os sistemas de saúde e assistência social. Bilhões de dólares dos contribuintes americanos são gastos anualmente para sustentar programas sociais, e boa parte destes recursos são utilizados com imigrantes ilegais, como foi mencionado neste artigo.
Portanto, aplaudo as novas medidas de Biden; afinal, a América pode e deve ser acolhedora, mas não pode ser a casa da mãe Joana.
Sobre Mark Morais
Mark Morais é advogado de Imigração e proprietário da Mark Morais Law Firm, escritório americano responsável por processos jurídicos de vistos e green cards para os Estados Unidos.
Mark é o único advogado brasileiro-americano que já trabalhou nas 3 principais agências federais de imigração dos EUA (USCIS, CBP e ICE) desempenhando as funções de Promotor de Imigração, Oficial de Asilo Político e Policial Federal de Imigração e Alfândega.
Mark Morais é formado em Direito e Administração de Empresas no Brasil e é Doutor em Jurisprudência nos Estados Unidos. Ele é licenciado para praticar Direito no Estado da Flórida e também na Capital Federal (District of Columbia).